sábado, novembro 27, 2004
na madrugada do domingo, 07 de novembro, acordei com os olhos ardendo e encharcados de lágrimas. quase não consegui dormi, menos incomidado com os olhos do que com a possibilidade de não poder comparecer a um compromisso profissional às 12h. passei o domingo praticamente na cama, com a sensação de ter areia no olho esquerdo.
na segunda, logo pela manhã, procurei um médico. consegui uma consulta para às 13h. fui examinado. a miopia de mais de 4 graus e a quase ceggueira do olho esquerdo não impediram que eu visse o ar preocupado da jovem médica ao me dar o dignóstico: duas úlceras na córnea. ela disse que o caso era sério e perguntou se eu tinha plano. diante da resposta negativa, pegou o celular, deu um telefonema e conseguiu uma consulta para mim no hospital das clínicas. receitou um colírio um colírio e se despediu com um "deus te abençoe". minha espinha gelou.
na manhã seguinte estava lá nas clínicas. o setor estava lotado. e com muitos casos bem mais complicados que o meu. esperei umas duas horas para ser atendido. a sala da consulta estava cheio de alunos. consequentemente, meu olho foi objeto de estudo de todos eles. pingaram um colírio em mim e esperei uns dez minutos. depois veio o momento que eu temia. a hora da raspagem, para coletar material e saber qual bactéria me afetava. a médica falou que eu só sentiria um pequeno incômodo. com uma espécie de pinça, ela manteve as minhas pálpebras abertas. fiquei com o personagem de laranja mecânica, an hora em que ele é reeducado, ou como cris cornell em um clipe do soundgarden. com o olho bom dava para ver a fina espátula raspando meus olhos. meia hora depois o colírio adequado foi receitado e eu fui embora. voltei lá várias vezes, e aprendi muita coisa. vi o quanto os gatos são perigosos, a contar pelos casos de toxoplasmose que haviam lá. percebi o gosto dos homens idosos por bonés. quase todos usam, sempre bonés de empresa e mais raramente de campanha política. vi um senhor de uns 80 anos, sentado no um canto, apertando um cigarrim e pensei: "será que estão receitando canabis no tratamento de glaucoma?". mas que o beck foi acendido, vi que era fumo de rolo mesmo. descobri também que a iguaria predileta dos usuários do SUS é o biscoito de polvilho. na consulta desta sexta-feira, que eu imagino ter sido a penúltima, fui contemplado com um diálogo formidável, vindo de um casal que estava atrás de mim na fila:
ELA: "isso aqui é público ou particular?"
ELE: "é particular, sei eu me consultei no particular eles não iam me mandar para o público."
ELA: "mas olha o tamanho da fila."
ELE: "vai ver é assim mesmo, deve ser porque tem várias especialidades. se eu paguei como é que vou me tratar no público?"
ELA: "ali está escrito "otorrinolaringologista", que é médico de rim."
um cineasta brasileiro ia se deliciar naquele lugar, com tantas expressões sofridas, roupas velhas. imaginei aquilo com uma fotografia de walter carvalho e uma trilha sonora legal. talvez um dia, quando eu for milionário e cair em sentimento de culpa por ter tanta grana enquanto velhinhos mofam nas filas do SUS, eu faça um filme sobre o tema. vou de pires na mão ao ministério da cultura captar uns recursos que poderiam ser utilizados para ajudar os velhinhos do meu brasil. eu sou cínico. o brasil precisa de cínicos.
estou de volta.
P.S: tirando o incômodo da demora em ser atendido, o tratamento das clínicas é excelente.
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na segunda, logo pela manhã, procurei um médico. consegui uma consulta para às 13h. fui examinado. a miopia de mais de 4 graus e a quase ceggueira do olho esquerdo não impediram que eu visse o ar preocupado da jovem médica ao me dar o dignóstico: duas úlceras na córnea. ela disse que o caso era sério e perguntou se eu tinha plano. diante da resposta negativa, pegou o celular, deu um telefonema e conseguiu uma consulta para mim no hospital das clínicas. receitou um colírio um colírio e se despediu com um "deus te abençoe". minha espinha gelou.
na manhã seguinte estava lá nas clínicas. o setor estava lotado. e com muitos casos bem mais complicados que o meu. esperei umas duas horas para ser atendido. a sala da consulta estava cheio de alunos. consequentemente, meu olho foi objeto de estudo de todos eles. pingaram um colírio em mim e esperei uns dez minutos. depois veio o momento que eu temia. a hora da raspagem, para coletar material e saber qual bactéria me afetava. a médica falou que eu só sentiria um pequeno incômodo. com uma espécie de pinça, ela manteve as minhas pálpebras abertas. fiquei com o personagem de laranja mecânica, an hora em que ele é reeducado, ou como cris cornell em um clipe do soundgarden. com o olho bom dava para ver a fina espátula raspando meus olhos. meia hora depois o colírio adequado foi receitado e eu fui embora. voltei lá várias vezes, e aprendi muita coisa. vi o quanto os gatos são perigosos, a contar pelos casos de toxoplasmose que haviam lá. percebi o gosto dos homens idosos por bonés. quase todos usam, sempre bonés de empresa e mais raramente de campanha política. vi um senhor de uns 80 anos, sentado no um canto, apertando um cigarrim e pensei: "será que estão receitando canabis no tratamento de glaucoma?". mas que o beck foi acendido, vi que era fumo de rolo mesmo. descobri também que a iguaria predileta dos usuários do SUS é o biscoito de polvilho. na consulta desta sexta-feira, que eu imagino ter sido a penúltima, fui contemplado com um diálogo formidável, vindo de um casal que estava atrás de mim na fila:
ELA: "isso aqui é público ou particular?"
ELE: "é particular, sei eu me consultei no particular eles não iam me mandar para o público."
ELA: "mas olha o tamanho da fila."
ELE: "vai ver é assim mesmo, deve ser porque tem várias especialidades. se eu paguei como é que vou me tratar no público?"
ELA: "ali está escrito "otorrinolaringologista", que é médico de rim."
um cineasta brasileiro ia se deliciar naquele lugar, com tantas expressões sofridas, roupas velhas. imaginei aquilo com uma fotografia de walter carvalho e uma trilha sonora legal. talvez um dia, quando eu for milionário e cair em sentimento de culpa por ter tanta grana enquanto velhinhos mofam nas filas do SUS, eu faça um filme sobre o tema. vou de pires na mão ao ministério da cultura captar uns recursos que poderiam ser utilizados para ajudar os velhinhos do meu brasil. eu sou cínico. o brasil precisa de cínicos.
estou de volta.
P.S: tirando o incômodo da demora em ser atendido, o tratamento das clínicas é excelente.
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